O Supremo Tribunal Federal (STF) recebeu ao menos dois pedidos liminares para a derrubada da resolução do Conselho Federal de Medicina (CFM) que proíbe os médicos do País de realizarem um procedimento clínico pré-aborto nos casos de gestação com mais de 22 semanas resultantes de estupro.
Para esses casos, o conselho proibiu os profissionais de realizarem a assistolia fetal, procedimento que leva à morte do feto para que depois ele seja retirado do útero da mulher. A prática é respalda pela Organização Mundial da Saúde (OMS) a partir de 20 semanas de gestação.
Desde a publicação da norma, no dia 3 de abril, especialistas já apontam que ela viola a lei e dificulta o acesso ao aborto legal principalmente a meninas em situação de maior vulnerabilidade.
No dia 5 de abril, o Centro de Estudos em Saúde (Cebes), a Sociedade Brasileira de Bioética (SBB), a Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco), a Associação Brasileira da Rede Unida e o Partido Socialismo e Liberdade (PSOL) entraram com um pedido liminar (usado em casos de urgência) no STF pedindo a suspensão da norma.
No processo, as entidades falam que houve violação do direito ao acesso ao melhor cuidado possível de saúde e o de “prevenir a violência contra meninas e mulheres”, entre outros pontos. O pedido foi incluído na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF 989), já existente desde 2022, que tratava de outros pedidos envolvendo a efetivação do direito ao aborto legal.
Nesta quarta-feira, 10, o PSOL protocolou junto ao STF um novo pedido, por meio da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF 1141), solicitando que o órgão considere a norma do CFM inconstitucional.
Devido à semelhança dos casos, o partido solicitou que o novo pedido fosse encaminhado para o ministro Edson Fachin, relator da ADPF 989. Na quinta-feira, 11, contudo, o ministro Alexandre de Moraes foi estabelecido como relator do caso, que já se encontra em análise.
Na ADPF, o partido argumenta que a norma do CFM restringiria de forma “absolutamente discricionária” a liberdade científica e o livre exercício profissional dos médicos. Além disso, segundo o PSOL, a resolução submete meninas e mulheres à manutenção de uma gestação compulsória ou à utilização de técnicas inseguras para o aborto, “submetendo-as a riscos de saúde ou morte”.
Outro ponto destacado pelo PSOL é que a norma seria discriminatória, uma vez que só proíbe o procedimento pré-aborto em caso de estupro e não nos outros dois casos em que ele é permitido por lei – risco a vida da gestante e anencefalia do feto.
O STF informou que não há definição sobre quando os pedidos liminares serão julgados.
MPF também questiona norma do CFM na Justiça
Na segunda-feira, 8, o Ministério Público Federal (MPF), a Sociedade Brasileira de Bioética (SBB) e o Centro Brasileiro de Estudos de Saúde (Cebes) entraram com uma ação civil pública pedindo a nulidade da resolução. O processo está na Justiça Federal do Rio Grande do Sul.
O pedido destaca que “no Brasil, o direito ao aborto é garantido legalmente em qualquer estágio da gestação, quando ela é resultante de violência sexual, assim como nos casos de anencefalia fetal e de risco à vida da mulher”. Além disso, diz que o “CFM usurpou competência do Congresso Nacional para legislar sobre o tema”.
Questionado sobre os pedidos no STF, o CFM disse que até o momento não recebeu qualquer notificação a respeito. Em relação à ação civil pública do MPF, o conselho informou que prestará os esclarecimentos solicitados dentro dos prazos definidos.
Na justifica da resolução, o CFM diz que o procedimento de assistolia fetal seria “profundamente antiético e perigoso em termos profissionais, salvo em situações muito específicas” e que “havendo viabilidade fetal, deve ser assegurada a tecnologia médica disponível para tentar”.