O debate sobre a distribuição de dividendos foi incluído de surpresa na reunião do conselho de administração da Petrobras desta sexta-feira (19), com o objetivo apenas de avalizar decisão que já havia sido tomada em Brasília, na opinião de conselheiros ouvidos pela Folha.
O tema não estava na pauta da reunião, como havia afirmado no dia anterior o próprio presidente da estatal, Jean Paul Prates. Segundo um conselheiro, o assunto entrou de forma disfarçada na pauta dentro de um item sobre avaliação do planejamento estratégico da companhia.
Essa discussão foi iniciada após o fechamento do pregão na B3, para evitar vazamentos com impactos sobre as ações. Os representantes do governo no conselho já sabiam que o debate levaria a uma revisão no posicionamento sobre os dividendos, mas conselheiros independentes foram pegos de surpresa.
A Folha apurou que houve um longo debate sobre o texto do comunicado que justificou a mudança de posicionamento menos de dois meses após o governo derrubar proposta da administração da companhia para distribuir 50% dos dividendos extraordinários.
Naquela ocasião, os representantes do governo argumentaram que o pagamento fragilizaria as finanças da companhia, contrariando visão da gestão da Petrobras. A decisão pela retenção veio dos ministérios de Minas e Energia e da Casa Civil, que convenceram o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
Nas semanas seguintes, diante da repercussão negativa do fato e da entrada do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, no grupo dos que defendiam a distribuição dos dividendos, passaram a vazar que precisavam de novos números da empresa para avaliar melhor a questão.
A direção da Petrobras e conselheiros independentes, porém, sempre defenderam que a proposta de distribuir 50% era adequada à situação financeira da companhia. Haddad convenceu Lula de que o dinheiro era necessário para o equilíbrio fiscal e o martelo foi batido.
No comunicado sobre o recuo, divulgado depois das 23h desta sexta, a Petrobras disse que “considerando cenários dinâmicos, como a evolução do [preço do petróleo] Brent, do câmbio e outros fatores”, o conselho agora entende que os dividendos não comprometem a estabilidade financeira da companhia.
A decisão pela distribuição já havia sido tomada por Lula, como a Folha antecipou no início da noite. A revisão do posicionamento do conselho apenas avaliza a proposta, que será feita pelo governo em assembleia de acionistas no próximo dia 25.
Conselheiros independentes avaliam que o recuo reforça a tese de que a decisão pela retenção no início de março tinha o objetivo de atingir Prates, que vem tendo conflitos com o ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, desde o início do governo.
A decisão inicial de reter os valores em uma reserva de lucros custou à Petrobras perda de R$ 55 bilhões em valor de mercado no dia seguinte à publicação de balanço que trouxe o segundo maior lucro da história da companhia.
Nas semanas seguintes, os papéis da empresa operaram com grande volatilidade, diante de notícias sobre o tema e, depois, sobre possível demissão de Prates, que passou as últimas semanas em processo de fritura.
No início do mês, a CVM (Comissão de Valores Mobiliários), abriu processo administrativo para investigar a comunicação da Petrobras, diante de vazamentos sobre eventual troca no comando da companhia.
A reunião desta sexta foi a última com a atual composição do conselho. Na próxima quinta, os acionistas da empresa elegerão um novo colegiado.
Só dois membros da gestão atual, porém, devem sair: o ex-ministro Sergio Machado Rezende, indicado pelo governo, e o representante dos minoritários Marcelo Mesquita. Este último não pode ser mais reeleito e o primeiro será trocado pelo secretário-executivo adjunto do Ministério da Fazenda, Rafael Dubeux.